O Tribunal apresentou, nesta quinta-feira (28/9), resultado da análise técnica que vai auxiliar o relator da PEC no Congresso Nacional, senador Eduardo Braga. O relatório aponta benefícios e falhas, além de sugerir mudanças no texto
O Tribunal de Contas da União (TCU) publicou o relatório de avaliação da Proposta de Emenda à Constituição 45/2019, a PEC da Reforma Tributária. A análise técnica vai subsidiar o relator da PEC no Senado Federal, senador Eduardo Braga. O TCU avaliou riscos de natureza econômica e jurídica e apresentou sugestões de melhorias. A conclusão geral foi que o impacto do projeto será positivo no crescimento da economia, com controvérsias sobre a dimensão desse efeito.
A PEC 45/2019 tem o objetivo de simplificar a tributação sobre o consumo de responsabilidade da União, estados e municípios. A principal mudança é a proposta de implementar um imposto único, chamado Imposto sobre o Valor Agregado (IVA) dual, com alterações profundas no sistema tributário atual. O IVA seria um imposto que incide em todas as etapas da produção, repassado até o consumidor final, com uma legislação mais uniforme e centralizada. Atualmente 174 países adotam o IVA ao redor do mundo, incluindo 37 dos 38 países da OCDE, tendo como única exceção os Estados Unidos.
Essa unificação seria feita a partir da extinção de diversos impostos atuais. Na esfera federal, o imposto unificado receberia o nome de Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS). Com a criação da CBS, seriam extintas as contribuições para o Programa de Integração Social (PIS) e para Financiamento da Seguridade Social (Cofins). Também seria eliminado o Imposto sobre Produtos Industrializados, substituído pelo imposto sobre produção, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, chamado Imposto Seletivo.
Nos estados e municípios, o texto prevê a unificação por meio do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). Seriam extintos o imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação (ICMS) e o imposto sobre serviços de qualquer natureza (ISS).
Se aprovada, a reforma tributária terá um período de transição de 50 anos (2029-2078) para que a distribuição da arrecadação dos novos tributos entre União, estados e municípios passe a seguir integralmente o princípio do destino. O intuito é corrigir possíveis perdas dos estados e municípios com arrecadação mais elevada devido a tributos no local de produção dos bens e serviços.
Apresentação do relatório
Na manhã desta quinta-feira (28/9), durante a reunião de entrega do relatório ao relator da Reforma Tributária no Senado, senador Eduardo Braga, o presidente do TCU, ministro Bruno Dantas, explicou que o Tribunal testou o modelo que o Ministério da Fazenda apresentou, a partir das premissas que foram aprovadas pela Câmara, fez as simulações necessárias e inseriu as conclusões no documento. Destacou, ainda, que o TCU fez uma avaliação do papel do Conselho Federativo e de como funcionaria a distribuição de recursos do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS).
“Neste relatório, nós apresentamos as conclusões que nos foram solicitadas, mas permanecemos à disposição para auxiliar o Congresso com a avaliação técnica do texto proposto. Gostaria de reiterar que este documento, feito por nossos auditores federais de controle externo, reflete as melhores práticas internacionais”, disse Dantas.
O senador agradeceu a colaboração do Tribunal, ressaltando que a grande beneficiada pelo estudo é a sociedade. “Esse documento é fundamental para orientar nossos trabalhos no Senado. Gostaria de destacar que o sistema que está sendo proposto no Brasil é único, daí a necessidade de termos apoio técnico e segurança sobre a análise dos modelos. O TCU nos traz uma opinião técnica avalizada, independente, que referenda dados e aponta caminhos, tendo como beneficiário final o contribuinte”, afirmou Braga.
Análise e sugestões do TCU da PEC da Reforma Tributária
O grupo de trabalho do TCU atuou entre os meses de julho e setembro e concentrou as análises em três dimensões: impactos econômicos e fiscais da reforma tributária; estimativa da alíquota e das exceções do Imposto sobre Operações com Bens e Serviços (IBS) e Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS); e governança do Conselho Federativo do IBS. Veja alguns dos principais resultados da análise de acordo com os temas abordados:
Impactos econômicos e fiscais
Sobre o impacto da reforma no PIB e na economia como um todo, os estudos indicam crescimento e ganhos de produtividade com a reforma, motivados pela melhor alocação dos recursos na economia. Também apontam que aumentos da alíquota e exceções geram custos de oportunidade em termos de crescimento econômico.
O trabalho analisou o impacto da PEC em diferentes setores econômicos, e concluiu que deve haver ganhos em todos eles, em intensidades diferentes, mas todos se beneficiam do crescimento econômico gerado e da redução dos custos de conformidade. Exceções à alíquota padrão afetam o crescimento e o custo de conformidade e, portanto, podem reduzir o impacto positivo compartilhado. Os estudos utilizados demonstram, nos piores cenários simulados, que nenhum setor da economia seria prejudicado com a implementação do IVA com base ampla, alíquota única e sem isenções. Este resultado provém do péssimo estado atual de ineficiência econômica gerado pelo atual sistema tributário no Brasil.
O TCU também fez avaliação sobre os impactos nos entes federados. De acordo com o último estudo disponível, a reforma beneficiará 78% das 27 unidades federadas, incluindo as 12 que possuem menor PIB per capita. Isso desconsiderando ganhos de crescimento. Em relação aos municípios, é provável que nenhuma capital e no máximo 32 municípios muito ricos corram o risco de ter queda de arrecadação em algum momento da transição, considerando um cenário pessimista no que diz respeito ao crescimento da economia.
Com uma mudança tão estrutural que migra a tributação do ente de origem para o ente de destino, haverá ganhadores e perdedores. Porém, a transição de 50 anos, o seguro receita e os fundos criados são soluções estruturais para esse problema.
Estimativa da alíquota e das exceções
O TCU confirmou os valores das alíquotas padrão do IBS/CBS apresentadas pelo Ministério da Fazenda, para os diversos cenários. A única ressalva foi sobre a transparência na adoção de um redutor dos custos de conformidade.
Sobre o custo das exceções, a redução de alíquota e isenções de tributos sobre consumo não são soluções efetivas como políticas públicas, seja sob o aspecto econômico, seja pela ótica social. Além disso, boa parte do benefício fiscal não é repassada ao contribuinte final. Dessa forma, é fundamental que as exceções sejam submetidas a avaliações anuais de custo-benefício entre 2026 e 2033 e que sejam previstas as condições necessárias para que o Congresso Nacional tenha a oportunidade de avaliar, a partir de 2034, se vale a pena ou não manter as exceções à alíquota padrão da tributação sobre o consumo.
Em relação à isenção da cesta básica e o cashback, da mesma forma que estudos anteriores comprovaram que o Bolsa Família é mais efetivo do que a desoneração da cesta básica, o cashback se apresenta como uma solução mais efetiva para focalizar um alívio para a população em situação de pobreza. Quanto aos gastos tributários, o TCU identificou falhas no processo de concessão, no cumprimento de contrapartidas e na prestação de contas dessas políticas públicas.
Sugestões do TCU sobre impactos econômicos e fiscais:
• Incluir dispositivo prevendo que as exceções à alíquota padrão serão submetidas a avaliações anuais de custo-benefício entre 2026 e 2033, e que Congresso Nacional terá a oportunidade de avaliar, já em 2034, se vale a pena ou não manter as exceções à alíquota padrão da tributação sobre o consumo, seja via Decreto Legislativo ou outro instrumento normativo adequado.
Conselho Federativo do Imposto sobre Bens e Serviços
O TCU avaliou temas relacionados à governança tributária do Conselho Federativo do IBS, entre eles o equilíbrio federativo; a regulação e o pagamento centralizado; o controle externo do Conselho; e o contencioso administrativo e judicial tributário.
A conclusão foi que não existem elementos que indiquem ofensa ao pacto federativo quanto à competência compartilhada do IBS, bem como quanto à capacidade tributária ativa, pois de acordo com a proposta os entes continuariam com o poder de decidir sobre tributos de sua competência. Também foi considerado baixo o risco de dependência na distribuição da receita do IBS, uma vez que o Conselho Federativo deve ser, na prática, uma espécie de Comitê Gestor do IBS, aplicando as regras previstas na Lei Complementar.
No entanto, o GT identificou um alto risco de desalinhamento entre a CBS e o IBS nos aspectos de regulação e de procedimentos, havendo a necessidade de regulação conjunta na mesma lei complementar, com previsão de processo administrativo fiscal unificado ou outro modelo que uniformize a jurisprudência.
Sobre contencioso judicial, há alto risco de decisões divergentes na Justiça Federal e na Justiça Estadual em face da mesma matéria relativa às controvérsias sobre IBS e CBS entre o sujeito passivo e a administração tributária.
Por fim, quanto ao controle externo do Conselho Federativo, a PEC 45 não define um órgão responsável para exercer as competências constitucionais de controle externo, nem tampouco fica claro como se dará a coordenação dos Poderes Legislativos e dos Tribunais de Contas de todos os estados e municípios. No intuito de contribuir para uma governança efetiva e transparente do Conselho Federativo, verifica-se a necessidade de definir um arranjo institucional também de natureza interfederativa, espelhando a inovação que o Conselho Federativo representa.
Sugestões do TCU sobre o Conselho Federativo do IBS:
• A criação de órgão colegiado dos tribunais de contas para realizar o controle externo do Conselho Federativo do IBS.
• Que o texto da PEC 45/2019 traga disposição expressa no sentido de que o IBS e a CBS sejam instituídos conjuntamente na mesma lei complementar.
• Que a lei complementar do IBS e da CBS estabeleça a competência concorrente da Justiça Federal e da Justiça Estadual para julgar as controvérsias entre o sujeito passivo e a respectiva administração tributária da CBS ou do IBS, com a regra de prevenção por contingência ao juízo que primeiro tomar conhecimento dos fatos relativos a estes tributos.
Fonte: TCU